segunda-feira, 29 de junho de 2009

Será que a Experiência, chega?

«Sendo todos os princípios do nosso entendimento apenas aplicáveis a objectos da experiência possível, toma-se evidente que todo raciocínio racional, que se aplica às coisas situadas fora das condições da experiência, ao invés de alcançar a verdade, apenas deve necessariamente chegar a uma aparência e a uma ilusão.
Mas o que caracteriza tal ilusão é que ela é inevitável (…) a tal ponto que, mesmo quando já nos apercebemos da sua falsidade, nos não podemos libertar dela. (...) De facto, o campo da experiência nunca nos satisfaz. (...) A nossa razão, para se satisfazer, deve, pois, necessariamente, tentar ultrapassar os limites da experiência e, por consequência, persuadir-se infalivelmente de que por esse caminho alcançará a extensão e a integralidade dos seus conhecimentos, coisa que ela não pode encontrar no campo dos fenómenos. Mas esta persuasão é uma ilusão completa: estando totalmente para além dos limites da nossa experiência sensível todos os conceitos e princípios do entendimento, e não podendo então ser aplicados a qualquer objecto, a razão ilude-se a si mesma quando atribui um valor objectivo a máximas completamente subjectivas, que, na realidade, apenas admite para sua própria satisfação.
(...) Todos os nossos raciocínios que pretendem sair do campo da experiência são ilusórios e infundamentados. (...) Não só a ideia de um ser supremo, mas até os conceitos de realidade, de substância, de causalidade, os de necessidade na existência, perdem toda significação e não são mais do que vãos nomes de conceitos, sem qualquer conteúdo, quando ousamos sair com eles do domínio das coisas sensíveis. (...) Quando nos não limitamos já a aplicar a nossa razão a objectos da experiência e tentamos alargá-la para além dos limites dessa experiência, resultam daí proposições dialécticas que a experiência não pode nem contraditar nem confirmar e cada uma das quais não só é isenta por si mesma de contradição, mas também encontra na natureza da razão condições que a tornam necessária; infelizmente, a asserção contrária não assenta em razões menos boas e menos necessárias. (...) Tais asserções capciosas dão origem a uma arena dialéctica onde a vitória será do partido que mantenha a ofensiva e onde aquele que for levado à defensiva terá de sucumbir.

Emmanuel Kant, in 'Crítica da Razão Pura'

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