"Programa de qualificação de adultos vai ser avaliado por uma equipa externa liderada por Roberto Carneiro.
"Operação fraudulenta", "manipulação estatística", um "embuste de dimensões nacionais". Estas foram algumas das expressões utilizadas ontem pelo deputado comunista Miguel Tiago para descrever a iniciativa do Governo Novas Oportunidades.
Dois anos após o lançamento do programa que visa qualificar com um diploma de 9.º ou 12.º anos um milhão de portugueses até 2010, o executivo agendou o tema para debate no Parlamento. Apresentou os números que comprovam a adesão em massa da população adulta - 352.500 abrangidos nas duas modalidades previstas, sendo que 289 mil se inscreveram em 2007 -, mas ouviu sobretudo críticas à forma como o processo está a ser conduzido e à ausência de dados sobre o impacto do processo na vida profissional dos formandos.
"O processo de suposto milagre estatístico a que assistimos é uma operação fraudulenta, fazendo primar o diploma sobre o conhecimento" e em que se procede ao "reconhecimento de competências [adquiridas ao longo da vida pessoal e profissional e não na escola] de forma muitas vezes próxima da validação administrativa", acusou Miguel Tiago. "A cada diploma é forçoso que corresponda efectivamente um verdadeiro processo de aprendizagem e qualificação e não é isso que, em muitos casos, se verifica", insistiu.
A avaliação foi contrariada pelo ministro do Trabalho, Vieira da Silva, que assegurou a existência de mecanismos de escrutínio sobre a qualidade do processo de Reconhecimento, Validação e Certificação de Competências (RVCC), defendendo ainda que quantidade e qualidade não são incompatíveis. "São os profissionais de ensino e formação que dão a certificação. Eles não são competentes para avaliar os percursos formativos?", interrogou o ministro.
Ainda assim, Vieira da Silva anunciou a constituição de uma equipa, composta por peritos nacionais e estrangeiros e liderada pelo ex-ministro da Educação Roberto Carneiro, que terá como missão acompanhar os efeitos do processo de qualificação nos formandos e a eficácia dos Centros Novas Oportunidades (CNO), responsáveis pelo diagnóstico e encaminhamento - para processos de RVCC ou para formações mais completas em cursos de educação e formação de adultos - dos candidatos.
O PSD pediu mais e sugeriu a criação de um observatório permanente e independente do Governo como forma de garantir a credibilidade do sistema.
Com 143 mil diplomas de ensino básico e secundário já atribuídos por estas duas vias, entre 2001 e 2007, a oposição também quis saber de que dados dispunha o Governo sobre o impacto da certificação. "O Governo vem exibir estatísticas, mas resultados na vida das pessoas não tem para mostrar", criticou Ana Drago, do Bloco de Esquerda. Os estudos ficaram prometidos pelo Governo para depois.
A contratação a recibos verdes e as baixas remunerações dos técnicos e formadores que são chamados a conduzir este processo nos CNO foram outras das críticas ouvidas no Parlamento.
Por parte do Governo, Vieira da Silva preferiu sublinhar que "nunca na história portuguesa se assistiu a uma mobilização na sociedade em torno das qualificações com esta dimensão" e apelou a toda a sociedade para que ajude a concretizar esta oportunidade."
In Jornal Público, 12 de Janeiro de 2008
Dois anos após o lançamento do programa que visa qualificar com um diploma de 9.º ou 12.º anos um milhão de portugueses até 2010, o executivo agendou o tema para debate no Parlamento. Apresentou os números que comprovam a adesão em massa da população adulta - 352.500 abrangidos nas duas modalidades previstas, sendo que 289 mil se inscreveram em 2007 -, mas ouviu sobretudo críticas à forma como o processo está a ser conduzido e à ausência de dados sobre o impacto do processo na vida profissional dos formandos.
"O processo de suposto milagre estatístico a que assistimos é uma operação fraudulenta, fazendo primar o diploma sobre o conhecimento" e em que se procede ao "reconhecimento de competências [adquiridas ao longo da vida pessoal e profissional e não na escola] de forma muitas vezes próxima da validação administrativa", acusou Miguel Tiago. "A cada diploma é forçoso que corresponda efectivamente um verdadeiro processo de aprendizagem e qualificação e não é isso que, em muitos casos, se verifica", insistiu.
A avaliação foi contrariada pelo ministro do Trabalho, Vieira da Silva, que assegurou a existência de mecanismos de escrutínio sobre a qualidade do processo de Reconhecimento, Validação e Certificação de Competências (RVCC), defendendo ainda que quantidade e qualidade não são incompatíveis. "São os profissionais de ensino e formação que dão a certificação. Eles não são competentes para avaliar os percursos formativos?", interrogou o ministro.
Ainda assim, Vieira da Silva anunciou a constituição de uma equipa, composta por peritos nacionais e estrangeiros e liderada pelo ex-ministro da Educação Roberto Carneiro, que terá como missão acompanhar os efeitos do processo de qualificação nos formandos e a eficácia dos Centros Novas Oportunidades (CNO), responsáveis pelo diagnóstico e encaminhamento - para processos de RVCC ou para formações mais completas em cursos de educação e formação de adultos - dos candidatos.
O PSD pediu mais e sugeriu a criação de um observatório permanente e independente do Governo como forma de garantir a credibilidade do sistema.
Com 143 mil diplomas de ensino básico e secundário já atribuídos por estas duas vias, entre 2001 e 2007, a oposição também quis saber de que dados dispunha o Governo sobre o impacto da certificação. "O Governo vem exibir estatísticas, mas resultados na vida das pessoas não tem para mostrar", criticou Ana Drago, do Bloco de Esquerda. Os estudos ficaram prometidos pelo Governo para depois.
A contratação a recibos verdes e as baixas remunerações dos técnicos e formadores que são chamados a conduzir este processo nos CNO foram outras das críticas ouvidas no Parlamento.
Por parte do Governo, Vieira da Silva preferiu sublinhar que "nunca na história portuguesa se assistiu a uma mobilização na sociedade em torno das qualificações com esta dimensão" e apelou a toda a sociedade para que ajude a concretizar esta oportunidade."
In Jornal Público, 12 de Janeiro de 2008
5 comentários:
Depois de ler este post, gostaria de deixar aqui uma sugestão: porque não reconhecer as capacidades de quem só sabe dizer mal e passar um diploma?
Penso que já era altura de reconhecer a "Má Língua" como a profissão do Séc.XXI, em Portugal, após muitos anos de experiência adquirida!
Sou profissional RVCC e considero que a Inicitiva Novas Oportunidades é extremamente válida, se realizada com a qualidade devida.Revolta-me, no entanto, que a maioria dos profissionais que estão a vestir a camisola e a contribuir para uma maior qualificação de Portugal sejam tratados de forma tão pouca digna!As condições de trabalho são muito precárias e em nada podem contribuir para uma estabilidade dos Centros! Ainda bem que existem Novas Oportunidades...resta agora saber se estas vão ser alargadas àqueles que contribuem para que as mesmas sejam uma realidade...
Concordo totalmente com o comentário da minha colega. Aconselho todos a lerem o artigo da Dr.ª Cármen Cavaco sobre a emergência de actividades profissionais na educação de adultos (Revista Portuguesa de Pedagogia), no qual afirma: "a emergência do profissional de RVCC nos CRVCC dá lugar ao nascimento de uma actividade profissional, que para benefício de todos os que participam neste processo, deve ser definida e baseada num suporte legal".
Se não fosse a dedicação (física, mental, emocional...) dos profissionais, o que seria deste processo? E já nem falo das metas, porque não concordo com os tão falados "números"...
Acho indecente (e ilegal) a nossa situação. Damos tudo a esta missão e o que nos dão a nós?... Nem aquilo a que todos os trabalhadores têm direito (férias, por ex., para já não falar no resto).
Penso que nos devíamos unir e pressionar as entidades competentes para a definição da nossa actividade profissional!
Bom trabalho a todos!
Todos estes comentários de Adultos e Profissionais no terreno, são muito importantes.Espero que toda esta troca de ideias e desconfianças por parte de tantos responsáveis, possa contribuir para dignificar toda a actividade de todos os Profissionais ligados ao RVCC. Venham fiscalizar o nosso trabalho no terreno... venham ver como contribuimos de modo sério para os tais números. Depois se forem justos, vão ver que nos devem alguma coisa...venham e vão conhecer muitos Portugueses que merecem esta Oportunidade. Mais do que isso os Governantes devem-lhes essa Oportunidade. Que os bons não desistam...de todas as partes!
Um Formador que já passou pelo Ensino Formal
julgo que seria, no mínimo, colocar qualquer referência ou link para a intervenção completa do PCP na Assembleia da República, garantindo que não são descontextualizados os conteúdos e incrementando a capacidade de esclarecimento deste blog.
Como a intervenção não está ainda online no site do parlamento, coloco-a aqui:
"Sr Presidente
Srs Deputados
A forma como o Governo vem referindo o Programa “Novas Oportunidades” para se promover a si próprio é apenas mais uma das componentes da sua enormíssima campanha de propaganda.
Mais uma vez o Governo utiliza a Assembleia da República, não como o espaço de trabalho e discussão, de franco e empenhado debate político, mas como o palco para os anúncios que, ocasional e conjunturalmente, servem a sua necessidade de auto-elogio.
No momento em que o Governo quer disfarçar a baixa qualificação dos portugueses, leva a cabo uma operação de manipulação estatística enquanto procede a um reconhecimento de competências em massa e coloca apenas na diplomação a tónica da política educativa deste Governo.
Perante a necessidade de qualificação da população urge criar as condições para que a escola pública possa de facto dar resposta às necessidades educativas do país. Para isso, seriam necessários significativos aumentos do investimento político e económico na Escola Pública, paralelamente à efectiva criação de condições sociais e económicas que possibilitem aos jovens e adultos ingressar num verdadeiro processo de aprendizagem.
O PCP saúda todos quantos fazem o esforço para verem reconhecidas as suas competências e todos quantos, com empenho, se dedicam à qualificação das suas capacidades e conhecimento. Mas alerta: a estes, o Governo não está a dar nada, ao contrário do que gosta de fazer crer. Na verdade, é seu dever garantir a Educação gratuita e de qualidade a toda a população.
O processo de suposto milagre estatístico a que assistimos é uma operação fraudulenta, fazendo primar o diploma sobre o conhecimento. O Governo recusa-se a garantir a todos o alargamento da sua formação e das suas capacidades numa perspectiva de emancipação humana. Na verdade, o Governo nega a jovens e adultos o acesso à educação em todas as suas dimensões, abrindo as portas exclusivamente ao processo de diplomação a todo o custo. A cada diploma é forçoso que corresponda efectivamente um verdadeiro processo de aprendizagem e qualificação e não é isso que, em muitos casos, se verifica.
O programa “Novas oportunidades” não representa, em grande parte dos casos, uma oportunidade para aprender, mas apenas uma oportunidade para ser considerado “apto para o trabalho” mesmo que isso não altere em absolutamente nada as condições cognitivas do indivíduo em causa. Por outro lado, representa uma excelente oportunidade para o Governo apresentar serviço sem ter feito rigorosamente. A forma como o Governo conduz o processo gera um embuste estatístico de dimensões nacionais. Só esta vontade de falsificar as estatísticas pode justificar que o financiamento dos centros “novas oportunidades” seja determinado em função do número de certificações.
Ora, um Governo que é responsável pelo aumento do desemprego e pela destruição líquida de emprego, pela diminuição em 115 mil postos de trabalho de emprego qualificado e pelo aumento de 72 mil postos de trabalho de baixa qualificação, que promove o trabalho precário e destrói os direitos e os salários dos trabalhadores tem alguma legitimidade para apregoar a qualificação? – Sim, este Governo substitui trabalho qualificado por trabalho com recurso a mão-de-obra de baixa qualificação.
Dirá o Governo que o PCP não valoriza o esforço dos muitos que, esperançosos, recorrem às diversas vertentes do programa. É o Governo quem não valoriza, como não respeita ao não garantir a qualidade da formação e ao proceder ao reconhecimento de competências de forma muitas vezes próxima da validação administrativa.
É o Governo quem não valoriza os milhares de estudantes jovens e adultos que procuram no sistema público de ensino a qualidade e a resposta para o seu défice de qualificação e a quem o Governo nega a formação, oferecendo apenas um diploma. É o Governo quem não respeita os milhares de estudantes jovens e adultos ao tornar cada vez mais exíguos os recursos da escola pública e ao criar cada vez mais entraves sociais e económicos à frequência escolar. É o Governo quem cria falsas expectativas ao apontar o emprego, o sucesso, a qualidade no ensino, como resultados dos cursos no âmbito das Novas Oportunidades.
Umas últimas palavras sobre o Ensino Profissional e Cursos de Educação e Formação:
O PCP defende a formação de técnicos especializados no sistema público de ensino, mas opôr-se-á sempre à utilização do Sistema de Ensino como mecanismo de reprodução e perpetuação das assimetrias sociais, de separação e selectividade social entre estudantes. A formação profissional não pode, sob nenhum prisma, ser sujeita a condições de dignidade inferior, encaminhando os filhos das camadas trabalhadoras para um ensino que apenas serve para falsificar os números do insucesso, do abandono e da qualificação dos portugueses, sem que constitua efectivamente um espaço de verdadeira aprendizagem e fruição de conhecimento, na perspectiva da formação da cultura integral do indivíduo. O Ensino Profissional está a ser utilizado pelo Governo para afastar os jovens do seu direito à formação integral e plena enquanto cidadãos.
Sr Presidente,
Srs Deputados,
Este Governo tratou os Professores como números, trata a escola pública com desdém e agora os estudantes, jovens e adultos, como peças numa linha de montagem a quem falta apenas colocar um selo de aptidão para o trabalho.
Nesta matéria, o Governo perdeu uma boa oportunidade para promover a educação e o desenvolvimento nacional. Preferiu, como é típico dos sucessivos governos, o caminho mais fácil: o da qualificação administrativa da população para apresentar um salto quantitativo nas estatísticas. Perdida esta, estamos certos de que este Governo não contará com “Novas Oportunidades”."
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