segunda-feira, 21 de janeiro de 2008

A (in)disciplina.

"Feche os olhos. Imagine uma sala de aula com 28 alunos. Entre os 14 e os 15 anos. Todos eles com telemóveis, leitores de música nos bolsos e da “geração Morangos com Açúcar”. Pense que hoje, devido ao conjunto de fontes de informação e dispersão, um aluno nessas idades tem um tempo de atenção muito pequeno.

Pense, por instantes que é professor (se não o é) e imagine que tem que ensinar uma determinada matéria num tempo de aula que vai até aos 90 minutos.

E agora? O que é a indisciplina? Um aluno levantar-se em pedir autorização? Um aluno falar alto na sala? Um aluno estar sem atenção? Um aluno fazer um comentário mais desadequado?

E onde começa a função de “disciplina” da escola?

Li à poucos dias uma entrevista de um conjunto de três médicos pediatras e uma frase ficou-me gravada na memória. Cito Pedro Oom: “Educar é transmitir valores. Valores que vão fazer com que determinada criança seja um dia um adulto com estas ou aquelas características. (…) Quem transmite esses valores é que está presente. Se o pai ou a mãe não estão presentes, como acontece tantas vezes nos dias que correm, então não podem estar a transmitir valores. Ou então estão a fazê-lo pela ausência…”

Ora, estará o leitor a pensar se eu não me terei enganado na citação. Não, não enganei. Talvez 80% da indisciplina nas escolas não é verdadeira indisciplina. É falta de valores, de regras de civilidade, de educação. E nasce em casa.

Ora, voltemos à sala de aula.

Hoje os professores são funcionários públicos que também dão aulas. Na sua maioria estão atulhados em reuniões, papelada, actas, registos e tudo o mais que retira o pouco tempo que se podiam dedicar à função de serem mestres. Sim, mestres. De educarem para a cidadania na componente que lhes compete. Sim, porque a escola também é em si mesmo um local de aprendizagem social e comunitária. E os alunos, crianças ou adolescentes, também ai encontram a ausência que Pedro Oom falava. O professores hoje, na sua maioria, não tem tempo, por mais que queriam, para ouvir, estar, partilhar aprendizagens com os seus alunos para além dos programas e actividades lectivas.

É altura de pensar tudo isto. Este modelo social que estamos a arrastar para as escolas. A ausência de humanismo e de atenção. É preciso cuidado de olhar para os nossos jovens e ver quem serão no futuro. Não é preciso curar os “males” da indisciplina por si só. É preciso curar os males da educação, da atenção, do tempo de cuidar dos alunos, filhos e seres humanos que serão amanhã, futuro."

Publicado pelo autor no Jornal Trevim

1 comentário:

Anónimo disse...

Li e senti muita vontade de agir...
Como eu gostava que todos os Professores meditassem nestas suas palavras... Como eu gostava de estar a dar aulas numa Escola para poder contribuir com o meu tempo...
O que vivi no terreno nas Escolas oficiais, e o que penso da Educação vai ao encontro desta reflexão. Obrigada.

Luz