terça-feira, 17 de julho de 2012

Estranhas marés e o navio fantasma

De Pirata tenho pouco, talvez o gosto pela aventura e o fascínio pelo mar, adoro pérolas e tesouros, mas sou incapaz de me apropriar daquilo que não me pertence de pleno direito.

Quando, em 2008, assumi a função de Coordenadora do CNO D. Inês de Castro, peguei no leme do barco e lá fui navegando, por mares a descobrir, tempestades e tumultos, de sextante em punho, porque navegar era preciso, havia mares e marés, a viagem era a razão do esforço e o esforço era o impulso do barco. Uma epopeia cheia de vida e de encontros, um hino à dignidade, em versos de inovação e ritmos criativos de progresso. Foi um tempo de crescimento, árduo e trabalhoso, mas profícuo e produtivo. Foi um conto das mil e uma descobertas em histórias de vidas ricas de saberes e plenas de semânticas de experiências. Que saudades desse mar! Que saudades da viagem e de perceber a vontade de nos ver viajar!

E agora, que estranhas marés são estas que nos chegam?  

Cresci convicta de que o comandante seria o último a deixar o navio, pelo que me preparei, desde o primeiro momento, a ancorar com dignidade, numa última viagem, numa qualquer ilha, mesmo que feita de promessas, para dar lugar a outra versão, melhorada ou não, da função que ainda desempenho. Mas o destino assim não quis. Destino, é o nome que se dá ao resultado de tomadas de decisão por um conjunto de políticos, com efeito direto na vida das pessoas que eles governam, mas em relação às quais não manifestam qualquer preocupação que não seja demagógica. Pois o destino (com d pequenino, para o distinguir das opções grandiosas da Vida que se expressam em Destino com D grande) quis que o primeiro a sair do barco fosse o comandante e os seus oficiais. Sem Coordenadora e sem formadores, como se pode manter um CNO em funcionamento? Não pode. 
Quando os decisores políticos querem acabar com um projeto, mandam decapitar a tripulação e acabe-se então com a viagem, argumentando, a seguir, que se o barco não tem condições, passa a navio fantasma e então é melhor atracar... Mas que hipocrisia é esta? Mas que estranha conceção do mundo, feita de falsidade, de aparências, de não-ditos, de silêncios, de surdinas, de ruído, de ausência de transparência, de falta de consideração, esvaziada de valor, é esta, que nos governa agora? Que país é este?
Onde estão os descobridores de antanho que por mares nunca dantes navegados foram para além do que se podia imaginar? 

Sinto nas veias a vibração das conchas que se agarraram ao casco do meu barco e ouço as gaivotas livres a chamar pelo vento, para que se ergam as velas  e que os canhões gritem a revolta! 
Haja força, companheiros, haverá marés e haverá marinheiros, sereias, zombies e outros monstros das profundezas, mas como o meu amigo Horácio já dizia:  "Os que atravessam os mares mudam o firmamento, mas não mudam a alma."  
A alma de marinheiro, porque o mar também é meu, a alma de Pessoa, enquanto valer a pena, a alma de Pirata se o destino quiser. 



2 comentários:

Dora Martins disse...

Boa tarde,

Apenas queria congratula-la pela forma adequada, forte, precisa e eficaz com que explorou a problemática que a muitos afecta: Coordenadores, Técnicos, Formadoras, mas também formandos e candidatos ao processo RVC, cuja incerteza os desorienta e confunde.

Creio que aguardar é um erro grave para cidadãos que apregoam, fomentam e cultivam a construção/implementação de uma cidadania activa.

Acredito que é estando atentos e remando contra ou a favor da maré, agindo de forma consciente, podemos fazer/exigir que nos integrem nas diferentes dinâmicas/decisões, enquanto agentes activos de mudança.
Concordo e sinto que, também eu, enquanto profissional e enquanto cidadã, tenho sido uma marioneta, manipulada pelos estudos de impacto, pelos orçamentos de estado, pelas estatísticas e pelos discursos tendenciosos de quem faz opinião.
Agradeço que tenha partilhado esta reflexão, a qual creio que deixará pistas para um futuro melhor e mais concertado.
Um Bem Haja!

pedro disse...

dra Anabela: estou com uma dúvida, nos anos anteriores, 2008,2009,2010 e 2011,quando chegava o fim do ano lectivo e portanto era obrigatório o gozo de férias e o aguardar de nova colocação ,não cancelava a sua vinculação ao CNO?E, posteriormente, era confirmada ou não, como cooordenadora.Não seria assim?